Lau Guimarães: arte de mulher é potente e está em constante ascensão

Conversa com a roteirista Lau Guimarães na live “sextou” do lançamento do Portal Firminas foi sobre a crescente expressão feminista na cultura
A roteirista e artista Lau Guimarães – Foto: arquivo pessoal

Colocar uma história no caminho das pessoas. Somar cores à paisagem cinzenta das metrópoles. Tintas, lambe-lambes, poesia e resistência. Esse é o atual universo de trabalho da roteirista paulistana Laura Guimarães, que conversou animadamente com a firmina pernambucana Fernanda Pereira sobre  arte de mulher e a expressão feminista na cultura.

Lau Guimarães é criadora do projeto de microrroteiros da cidade: os coloridos lambe-lambes com mensagens curtas espalhados pelas ruas. A ideia partiu da vontade de traduzir histórias em poucas palavras, com número limitado de caracteres. Formada em cinema, sabe que cada cena contém uma história completa e são exatamente as pequenas histórias do cotidiano que inspiram cada um dos seus microrroteiros.

Ela começou a colar lambes por causa da Lei Cidade Limpa de 2010, quando, por considerarem São Paulo cinzenta demais, vários artistas, espontaneamente, começaram a trazer cores para a metrópole.

“Pensei: vou escrever uma cena com 140 caracteres para o Twitter”, conta Lau, que chegou a escrever 70 microrroteiros em menos de um mês de projeto. O primeiro? Uma cena vista por ela, voltando de Campos do Jordão, ainda na estrada, em meio a uma forte chuva: um homem colhia flores. Logo depois, estava Lau colando seus microrroteiros, impressos em papéis coloridos, em pontos de ônibus e postes de ruas movimentadas de São Paulo.

Os microrroteiros espalhados pelas ruas de São Paulo

Lau Guimarães: Somos feitos uns dos outros

Os microrroteiros de Lau, de forma criativa e lúdica, convidam as pessoas a imaginarem uma história no meio do caminho, “de repente”, como ela diz. E são tantas que muitas pessoas acham que ela é um coletivo. De fato, Laura Guimarães é muitas. “Tudo que faço tem interferência de outras pessoas ou de conversas com amigas artistas. É importante fazermos coisas juntas, cavar espaços, a gente vai lá e faz o nosso espaço. Eu cada vez mais entendo que somos feitos uns dos outros”, reconhece.

Um dos trabalhos de Lau Guimarães com forte impacto foi o Tarsila Inspira, realizado durante a exposição das obras de Tarsila do Amaral no MASP, em 2019. Ela foi convidada por Simone Siss a fazer, com mais cinco mulheres artistas, uma visita à exposição conduzida pela sobrinha-neta da pintora.

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“Fomos na exposição com a Tarsilinha do Amaral contando histórias, o que me trouxe esse trabalho de linhagem de mulheres, o quanto a Tarsila artista, naquele momento, foi uma revolucionária, uma mulher maravilhosa. Ela faz parte do mesmo lugar que a gente tá hoje: abrindo portas e em constante desenvolvimento”, explica.

A partir dessa visita, as artistas criaram releituras de algumas obras de Tarsila em 5 empenas (paredes laterais de um edifício, sem aberturas de janelas ou portas).

Arte por Simone Siss e Laura Guimarães no Projeto Tarsila Inspira – Imagem @jabbakarin

Invisibilidade

Não é de hoje que temos mulheres maravilhosas fazendo arte nas ruas, acontece que elas são invisíveis, denuncia Lau, e são muitas. Como exemplo, ela cita a ação 100 Minas na Rua, um projeto que utiliza o grafite  para renovar espaços urbanos em bairros de São Paulo e dar mais visibilidade para o trabalho de mulheres artistas de rua. Como estímulo à participação, em 2019, ficou determinado que as primeiras cem inscritas ganhariam o spray. “Mais de 400 mulheres se inscreveram com coisas maravilhosas. Estão lá, na Vila Leopoldina, mais de 400 grafites nos muros da Estação, bem diversificado. Hoje não tem desculpa pra falar que não tem mulher que faz, tem mulher sim”, garante a artista, que compara essa invisibilidade com a das mulheres na nossa história escrita por homens: “É uma disputa de narrativas. Se a gente continuar deixando só eles contarem a história, nós vamos continuar invisíveis”.

Lau Guimarães colando os lambes – Foto: arquivo pessoal

Escadaria Marielle Franco

Durante a conversa na live, a firmina Fernanda destacou a participação de Lau Guimarães no movimento de artistas que cuidam da Escadaria Marielle Franco, localizada na Rua Cardeal Arco-Verde, no bairro de Pinheiros da capital paulista.

“A foto de Marielle é uma forma dela não ser esquecida. Foi criada após três dias do assassinato. Ela precisava seguir presente. O assassinato dela é o que mais fala sobre o país da gente hoje”, pontuou Lau, com tristeza. “Hoje é uma escadaria de representatividade de mulheres, no entorno da imagem de Marielle há grafites de mulheres sustentando a foto para lembrar o que Marielle representa e as mulheres que seguem seu legado”, disse.

Escadão Marielle Franco – Imagem: Brasil De Fato

Arte de mulher é Resistência

Foram muitos comentários, várias perguntas, e Lau foi precisa quando indagada sobre o endurecimento da arte no Brasil de Bolsonaro. “Esse fulano na presidência é uma reação contrária aos nossos movimentos. Esse grupo no poder é contra mulher, contra outras minorais e ficaram ainda mais violentos”, disse. “Quando comecei a colar, uma mulher branca, a polícia desviava o olhar, pra eles eu era uma mulher inofensiva. Hoje não sou mais. Quando a gente começa realmente a se colocar, deixa de ser inofensiva”, relatou.

E prosseguiu: “arte é resistência. A arte de mulher é muito potente e está num momento de movimento. Tem muita força, o feminino é muito potente na delicadeza”.

A live pode ser conferida na íntegra no IGTV do Firminas.

Para saber mais:

Laura Guimarães nas redes sociais: Twitter, Instagram e Facebook

Blog da roteirista

Arte Fora dos Museus

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