“A gestão da crise atual está sendo feita cotidianamente pelas mulheres”

Live ‘Saúde e Autocuidado’ trouxe informações fundamentais para as mulheres alimentarem o amor próprio e superarem dificuldades
Guacira Oliveira – Foto: arquivo pessoal

Guacira é uma daquelas pessoas que ao vê-la temos a vontade de conhecê-la pessoalmente. Sorriso largo, voz mansa, olhar sonhador e o uso de palavras que nos levam a absorver ensinamentos que podem trazer uma transformação benéfica.

O papo teve início quando Guacira disse que autoreflexão se faz extremamente necessária nesse momento tão difícil que estamos vivendo, sendo o caminho para “sairmos desse mar de desinformação, onde tantos estão se afogando”. Para ela, nossos recursos e conhecimentos, colocados em diálogo, pode ser a saída para algo novo. “Autoreflexão nos traz conhecimento das nossas capacidades. Tem que ter autoreflexão e ação para criar outros caminhos”.

O fortalecimento das mulheres em relação às muitas dificuldades que a pandemia impôs – como o enfrentamento à violência do companheiro, o desemprego, o cuidado e a responsabilidade escolar com os filhos – pode ser alcançado por meio da união com outras mulheres. “As mulheres vêm construído processos de solidariedade e cuidado. É olhar para a outra e saber a dificuldade que ela está vivendo, socorrendo-a nos momentos difíceis, o cuidado com a outra, além do ponto de vista material, mas de acolhimento. A gestão dessa crise está sendo feita cotidianamente pelas mulheres dentro das casas, nas comunidades”.

Guacira conta que a mobilização de mulheres tem auxiliado no enfrentamento dessas dificuldades, por meio de coletivos, reuniões por whatsapp para aquelas que não têm acesso à internet, procurando a união em prol do apoio sempre.

Mercado da beleza X Autocuidado

O autocuidado mercantilizado vai dar retorno para o próprio mercado, que é mercantilista, gerando lucro em uma lógica capitalista e patriarcal, que não é a ideia de autocuidado.

“Para quem foi cobrada sempre para cuidar dos outros, nos darmos o direito de nos cuidarmos, o autocuidado passa a ser uma ideia subversiva. A mulher é pressionada sempre a trilhar o caminho do sacrifício, do trabalho extremo para ter reconhecimento. Buscamos um cuidado para gente, entre nós, e não algo que é obrigação, exploração e sujeição. Carregamos as marcas da violência em nós, na nossa ancestralidade, do escravagismo, do patriarcado, do genocídio dos povos indígenas, da pobreza e da forme sempre presente na nossa história. O cuidado que queremos é o que olhe para a fragilidade, para a delicadeza. É diferente uma mulher de classe alta, branca, enfrentar o que a pandemia impôs em relação à mulher pobre da pele preta; a pandemia abriu essas feridas históricas, como o medo da fome. Autocuidado não é obedecer a um padrão de beleza, a uma norma estética, é algo muito mais profundo, é a ética do cuidado, é cuidar a vida, é respeitar o direito de vida e de ser livre”, explica Guacira.

Religiosidade e Autocuidado

Para Guacira a religião tem duas possibilidades: “Acredito que há uma conexão forte entre religiosidade e autocuidado. Trazemos nossa herança, uma história em nossos corpos. A espiritualidade pode ser uma forma emancipatória, ao acessar a força que a ancestralidade nos traz, que resgata a força de luta do bem viver, como o que está acontecendo nos terreiros de candomblé que dão força à mulher. Há outro ponto que traz a submissão, a sujeição, no fundamentalismo, onde as mulheres estão sendo obrigadas a voltar aos seus antigos lugares, a abandonar suas poucas conquistas que tiveram. Há muitas possibilidades, umas libertárias e outras opressoras”.

Emoção X Razão

“Nossa sociedade quer que sejamos da cabeça para cima. Mas nós temos um corpo e temos emoções, que é o que orienta o que pensamos. Vivemos muitas fragmentações, uma delas é entre natureza e sociedade. A natureza também está subjugada na nossa sociedade, que é racional e acredita que pode dominar a natureza e a mulher é vista nesse lugar, mais próxima da natureza, o homem branco está mais perto dessa racionalidade, que é devastadora, agressiva, a que submete. Separar razão de emoção é outra mentira que vivemos, isso não tem luz, não compreende totalmente, não tem visão holística. Tem que reunir corpo e mente e há muitas fragmentações na nossa sociedade”, elucida Guacira. 

Esta live fez parte da programação de lives promovida pelo Portal Firminas por ocasião de seu lançamento, o tema “Saúde e Autocuidado – Aspirações e Inspirações” foi apresentado pela jornalista Elara Leite, que entrevistou a fundadora do CFemea, Guacira Oliveira.

Para conhecer o CFemea – Centro Feminista de Estudos e Assessoria: “Organização não governamental feminista e antirracista, de caráter público e sem fins lucrativos – foi fundada em Brasília, em julho de 1989, por um grupo de mulheres feministas, que assumiram a luta pela regulamentação de novos direitos conquistados na Constituição Federal de 1988”. Acesse www.cfemea.org.br

O Portal Firminas trouxe outras lives que estão em seu Instagram @portalfirminas. Conheça!