Polêmica com roupa de Jill Biden revela etarismo e machismo estrutural

Destaque das meias usadas pela primeira dama dos EUA Jill Biden

Em cerimônias oficiais, homens e mulheres em cargos públicos seguem uma espécie de dress code universal, um código de conduta para se vestir com elegância e distinção. Esse tipo de manual para um visual público normalmente é seguido em atividades diárias e compromissos oficiais. Há cerca de duas semanas, no entanto, a primeira-dama dos EUA, Jill Biden, virou alvo de comentários maldosos nas redes sociais por ter sido fotografada de mini saia e meia calça rendada em compromisso pessoal.

“Meu Deus, ela parece a avó da Madonna”, um dos comentários sobre a roupa de Jill Biden no Twitter

A repercussão entre os norteamericanos envolveu comentários sobre como a primeira-dama poderia usar uma meia calça com detalhes de renda aos 69 anos, entre outras falas que denotam etarismo e machismo estrutural. A designer de moda e mestranda em sociologia Lara Joia explica que a primeira-dama não precisa seguir o dress code se não estiver em um compromisso oficial, mas que em agendas desse tipo são tomados vários cuidados com os figurinos adotados.

“Existem algumas demandas, algumas orientações para que a vestimenta seja adequada e quando acontece um compromisso oficial, normalmente presta-se muita atenção nas roupas que as mulheres estão usando. Os próprios estilistas e as pessoas que vestem essas mulheres fazem questão de buscar roupas que transmitam mensagens. No dia da posse, tanto Jill Biden quanto Kamala Harris e outras pessoas fizeram questão de usar tons de azul que é a cor do partido republicano”, explanou.

Lara Joia é pesquisadora nas áreas de moda, política e cultura. Foto cedida de acervo pessoal

Compromisso oficial X vida privada

Lara Joia acrescenta que as formas escolhidas, o tipo de tecido, o fato de serem roupas mais rígidas, com linhas mais retas, transmitem mensagens que as pessoas absorvem mesmo que de forma inconsciente. “Isso existe sim. Só que o caso da Jill Biden não é de um compromisso oficial, ela não estava em horário de trabalho, por isso não precisa seguir esse tipo de código, não tem obrigação de fazer isso na vida privada”, pontuou.

“Dizer se é adequado não cabe às pessoas. Isso é uma forma de colocar limitações para as mulheres na hora de vestir. O vestir tem que ser uma coisa muito livre e muito pessoal. Ficar ditando o que a pessoa deve vestir conforme a idade que ela tem é uma forma de oprimir a expressão pessoal, seja a pessoa a primeira-dama ou uma cidadã comum”, ressaltou a designer.

Lara prossegue lembrando que esse comportamento das redes é uma expressão de machismo estrutural injustificável. “Ela tem liberdade de usar a roupa que quiser. Sexy ou não, a decisão cabe a ela. Além de ser uma mulher e muitos já se intitulam com o poder de dizer o que uma mulher deve vestir, ela tem mais idade. Mas o problema é justamente nesse julgar do vestir, que nesse caso é incabível porque ela está na vida pessoal dela”, ponderou.

Liberdade para vestir

A ex primeira-dama de João Pessoa, capital da Paraíba, Maysa Cartaxo afirma que em seu período acompanhando o marido nas ações como prefeito, sempre teve liberdade para vestir o que gostava e se sentia bem, seja em compromissos oficiais ou na vida privada.

Maysa Cartaxo durante evento pessoal enquanto era primeira-dama.
Foto cedida de acervo pessoal

“Nunca tive ninguém que me dissesse ‘vista isso ou vista aquilo’. Nunca tive isso. Eu gosto dessa liberdade de me vestir. Não gosto de ter essa coisa de pessoas dizendo que a primeira dama tem que ter isso ou tem que ter aquilo, tipo um checklist. Eu nunca me adaptei ou me enquadrei nessa caixinha”, afirma Maysa, que assim como Jill Biden, também é professora.

Maysa conta que sua maior preocupação sempre foi se estava ou não suficientemente arrumada para o cargo que ocupava. “Eu usava mais calça jeans, mais justa nas pernas, um tênis, uma coisa mais despojada, ao mesmo tempo que eu gosto de um corte de alfaiataria, prefiro um estilo minimalista, não gosto de cores chamativas, gosto de coisas mais lisas, gosto de usar uma roupa atemporal. Nunca me enquadrei nesse código, nessa coisa ditadora”, disse.

Para a ex-primeira dama, havia uma cobrança e uma comparação com outras ex-primeiras damas sobre que marcas ela deveria adotar em seu guarda-roupa, mas ela diz que comprava apenas o que tinha condições com seu salário de professora. “Eu sempre disse que tinha que ter a condição de comprar como professora, eu nunca vi o trabalho como primeira-dama como um cargo”, resumiu.

“Se Jill Biden usa roupa curta e se sente bem, tudo bem, a idade está na cabeça da gente. A gente é o que é e não tem esses rótulos. Cada um faz do jeito que pensa. É sempre bom ser você mesma, ter uma identidade”, finalizou.

Confira alguns comentários no Twitter sobre o visual de Jill Biden

“Essa é a primeira-dama dra. Jill Biden e ela pode usar o que quiser”
“Por mais 29 dólares Jill Biden poderia ter complementado sua fantasia de Halloween com a vassoura opcional”
“Jill Biden gostaria se as pessoas parassem de retuítar essa figura de seu visual tosco”

Leia também

Lula volta ao jogo político: não esqueçamos do golpe machista contra Dilma

Tagged: , , , , , , ,