Para antropóloga, machismo de ministros nas redes é tentativa de desviar a pauta

Na última semana, celebridades foram às redes sociais para exigir a saída do Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Sales, com a hashtag #forasalles, no mesmo período em que o mundo se voltou para o desmatamento no Brasil, com a realização da Cúpula do Clima. Entre as celebridades que postaram pela saída de Ricardo Salles estava a cantora Anitta.

Anitta se posicionou pelo #forasalles. Print de Twitter

Ao referir-se ao ministro, Anitta tachou o trabalho dele como um “desserviço ao meio ambiente”. Após o post de Anitta, Salles devolveu o tweet da celebridade chamando-a de teletubbie, em alusão a um programa infantil da década de 1990. Anitta não se intimidou e respondeu: “ao invés de trabalhar ficam de gracinha no Twitter… esse é nosso governo teen… até eu to mais ocupada fazendo algo pelo meu país do que você, meu querido”.

A discussão entre Anitta e o ministro no Twitter se estendeu com tentativas de Salles em desqualificar o discurso da cantora, que questionou qual o perigo de acabar com a fiscalização do Ibama ou de ir contra a atuação da Polícia Federal em relação ao desmatamento.

Denúncia na PGR

Uma notícia-crime contra Ricardo Salles foi encaminhada à Procuradoria-Geral da República pela Ministra Carmen Lúcia, do STF, na qual o ministro do meio ambiente é acusado de formar uma organização criminosa para beneficiar o corte ilegal de madeira e dificultar fiscalização de órgãos como Polícia Federal e Ibama.

A notícia-crime, encaminhada nesta terça-feira (27), envolve duas ações, uma movida pelo PDT e outra pelo ex-superintendente da Polícia Federal no Amazonas, Alexandre Saraiva. Coincidentemente, um dia depois de apresentar a denúncia, Alexandre foi afastado do cargo.

Antiministro

Para a antropóloga Carla Delgado, o comportamento e a linguagem chula utilizados por Salles e outros ministros do governo Bolsonaro é uma estratégia, uma espécie de cortina de fumaça para desviar o assunto real. Nesse caso, o movimento que pede a saída do ministro e, para além disso, as questões ambientais brasileiras.

Queimadas também têm sido problema recorrente na Amazônia. Print de vídeo

“O Ministro Ricardo Salles está no governo desde o início e faz parte de um núcleo em que talvez seja um dos representantes mais claros dos propósitos desse governo, que é a destruição das políticas públicas em cada uma das áreas. Existe até uma ideia de que temos na verdade antiministros”, resumiu Carla.

A antropóloga acrescenta que esse movimento de celebridades que se unem para pedir a saída de Ricardo Sales ajuda a dar visibilidade à questão ambiental no País e contribui para potencializar as lutas das lideranças indígenas, povos ribeirinhos, populações tradicionais e ambientalistas.

“Em relação ao comportamento de atacar com comentários depreciativos, machistas, xenofóbicos e racistas, quem tenta dar visibilidade a esse movimento, é uma tentativa de desviar a pauta. Tem também um apelo ao público que é fiel eleitor do Bolsonaro e de políticos que representam esse grupo”, ressaltou.

Discussões nas redes

Essa não é a primeira vez que ministros e até o próprio presidente Jair Bolsonaro fazem comentários pejorativos, machistas ou homofóbicos nas redes sociais, seja no Twitter, seja durante lives. O comportamento também chega a superar o discurso online e pode ser verificado em entrevistas coletivas e atividades presenciais.

Alguns ministros do governo e o próprio presidente Bolsonaro são muito ativos nas redes sociais. Em 2020, somente o ministro Ricardo Sales fez cerca de 420 tweets, entre material próprio e RTs, mais de um tweet por dia, sem contar respostas para tweets de outras pessoas.

No ano passado, o Brasil teve o maior recorde de desmatamento dos últimos dez anos, conforme dados do Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia, mais de 8 mil m² . Para cada tweet que o ministro publicou em 2020, mais de 15m² de árvores foram desmatadas.

Salles pensante. Charge da colunista Elara Leite.

Tagged: , , , , ,