Sinal verde para o acolhimento

Jorge Araújo/Fotos Publicas

Era um domingo comemorativo e saudosista, após dias intensos de temperatura fria em São Paulo, veio o calor irradiado pela luz solar e convidativo para estar ao ar livre. Aproveitei a tarde quente para encontrar uma amiga com seu pequeno cachorro e passear por uma região diferente da minha. Deixei o casaco na bolsa, fiquei apenas de calça e blusa sem mangas para a caminhada entre ruas arborizadas, por mais de duas horas, com paradas estratégicas em espaços vazios, abertos e receptivos para o animalzinho.

Depois dessa movimentação, como ainda é inverno, ao anoitecer voltou a esfriar, assim coloquei a vestimenta guardada e segui para a minha casa. Durante o percurso, enquanto conversava com o motorista, nos segundos de semáforo fechado vi algo sutil e forte: uma senhora com caixa de doces ganhou um agasalho verde em tom claro de um outro condutor. Ela segurou a roupa e foi para a calçada vestir.

No meio de dezenas de veículos, entre iluminações artificiais, a atitude generosa de doação para alguém em situação vulnerável. A cena curta e veloz se tornou o assunto principal do meu regresso, como atitude simples faz a diferença na vida de alguém. Presenciar a solidariedade é emocionante e contagiante, dá esperança. Seguimos em elogios e desejos do melhor para os envolvidos, aquele que agiu para amenizar o sofrimento e quem se sentiu presenteada com algo para amenizar o frio.

Enquanto falava, olhei o trajeto que passava e a realidade de diversas pessoas deitadas em passagem subterrânea na grande avenida suntuosa e cartão postal. Ainda é período de pandemia, que atinge tantos, com perdas e tudo tão doloroso. Uma sobrevivência difícil! A ferida da desigualdade social bem escancarada, em desabrigados e expostos nas ruas.

O mais absurdo que na mesma noite li sobre representante pública maldizer do sacerdote que cumpre a premissa cristã do amor ao próximo, com ação de acolhimento humanitário. Mentalmente voltei ao momento do farol vermelho, flash do sorriso da vendedora com algo para lhe aquecer. Me bateu o desejo de que a força de quem movimenta a energia da solidariedade cresça e vença discursos mentirosos.

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