Mulheres são 87% das vítimas de perseguição

Dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo mostram que em 11 meses foram registrados 15.258 boletins de ocorrência por perseguição, média de dois a cada hora

Segundo os dados da SSP, 22% das vítimas tinham algum tipo de relacionamento amoroso com o agressor / Crédito: Freepix

A empresária Jéssika Kirchner compartilha nas redes sociais do seu salão de beleza as fotos de suas clientes. Um dia, um homem comentou em uma das imagens: “gostosa”. A equipe apagou o comentário e o homem mandou mensagem agressiva pelo whatsapp do salão. O número foi bloqueado e então ele passou a mandar e-mails com ameaças, dizendo que sabia o endereço do local e o horário de atendimento. Jéssika engrossa a estatística que mostra que 87% das vítimas do crime de perseguição são pessoas do gênero feminino. A tipificação da prática criminosa ocorreu em 30 de março de 2021 e até fevereiro de 2022, apenas no Estado de São Paulo, já foram registrados 15.258 boletins de ocorrência, média de dois a cada hora.

Apesar da facilidade de acesso que a internet e as redes sociais propiciam no contato entre as pessoas, os crimes de perseguição (ou stalking, no termo em inglês) são cometidos, em sua maioria, de maneira presencial. Segundo os dados obtidos pelo Portal Firminas junto à SSP (Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo), apenas 10% dos registros reportam situações ocorridas por meios digitais. E em 22% dos casos, o agressor tinha algum tipo de relacionamento amoroso com a vítima.

De março de 2021 a fevereiro de 2022 foram dois casos por hora / Fonte: SSP / Arte: Aline Melo

Professora e doutora em Direito Penal e Processo Penal, Janaina Daniel Varalli explica que o crime de perseguição é a conduta praticada, reiteradamente e por qualquer meio, de perseguir a vítima e ameaçar sua integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. “Assim, a perseguição, também conhecida por stalking, não é somente a perseguição física, mas também ligações reiteradas, envio de mensagens de áudio ou texto, tudo de modo a ameaçar perturbar a paz, a vida privada e a liberdade da vítima”, completa.

Advogada da Balm Consultoria, Beatriz Almeida ressalta que o crime é configurado a partir da perseguição repetida que coloca em risco a integridade física ou psicológica de alguém. “Essa repetição pode se dar por qualquer meio. Ou seja, é um crime de ação livre. E pode ser praticado das mais diversas formas, desde perseguição em redes sociais, envio de mensagens, ligações frequentes para os lugares que o agressor sabe que a vítima frequenta como faculdade, local de trabalho, templo religioso, casa de familiares e outros espaços”, enumera.

Ato não é considerado crime de gênero

Apenas 22% dos ataques ocorreram por meio virtual / Crédito: Freepix

Muito embora a maioria absoluta das vítimas sejam pessoas do gênero feminino, Beatriz explica que a perseguição não deve ser considerada um crime de gênero e que, juridicamente, é um crime bicomum, ou seja, não há nenhum tipo de característica específica seja para o autor, seja para a vítima. “Há o aumento de pena para o caso de vítimas idosas, adolescentes ou crianças, bem como mulheres que estejam sendo perseguidas em decorrência do gênero”, especifica.

A advogada destaca, no entanto, que embora não seja considerado um crime de gênero, se a perseguição ocorrer no contexto de uma relação afetiva/doméstica, pode ser considerado “stalking doméstico”. Neste caso, a vítima também estará amparada pela legislação da Lei Maria da Penha, podendo ter acesso, por exemplo, a medidas protetivas.

O que fazer no caso de perseguição

As advogadas são unânimes em afirmar que é importante que casos como o de Jessica sejam registrados por meio de boletim de ocorrência e que restringir o acesso das redes sociais, evitar a divulgação de dados pessoais e informações que possam identificar a rotina das pessoas, são medidas que podem contribuir para evitar esse tipo de ataque. “E sempre buscar apoio das autoridades quando necessário”, finaliza Janaina.