Filme de palestina indicado ao Oscar retrata vida sob ocupação militar
A diretora palestina Farah Nabulsi traz em The Present histórias humanas que são sub-representadas e mal compreendidas
A palestina britânica Farah Nabulsi, de 29 anos, sempre quis levar às telas do cinema personagens quase nunca representados. Para além disso, este desejo tem direta e intensa conexão com sua própria história, memória e raiz. Agora pode levar ao público tudo isso na grande cerimônia do Oscar.
“Eu queria contar estas histórias humanas que são enormemente sub-representadas e mal compreendidas”, defendeu a cineasta em entrevista concedida ao canal de streaming PeakcockTV.
Concorrendo na categoria de curta-metragem de ação com “O Presente”, a diretora baseada em Londres já recebeu o prêmio Bafta por esta estreia, na categoria de curta de ação.
Quando soube da indicação ao Oscar, Farah Nabulsi estava em casa e pulou empolgada sobre a sua mesa. O momento foi registrado pela família e ela publicou o registro nas redes sociais.
O Presente
O filme é a estreia de Nabulsi na direção e, de maneira humana, tratando assuntos cotidianos para abordar outros complexos e duros, traz a história do palestino Yusef (Saleh Bakri), que quer surpreender sua esposa com uma geladeira como presente de aniversário, e de sua filha Yasmine (Mariam Kanj), que o acompanha neste dia de compras que significa uma verdadeira jornada.
A dura jornada de todos palestinos.
Na história, o grande dia de celebração desta família palestina foi arruinado assim que chegam a um checkpoint – posto de controle, com soldados israelenses.
A menina Yasmine testemunha a humilhação que sofre o pai para que sejam liberados em direção ao centro de compras.
Após horas de espera, com pai e filha separados por gaiolas, os soldados liberam os dois que seguem pela longa caminhada. A menina, com as calças molhadas de urina, acompanha o pai, sem imaginar como seria o retorno.
Estariam os soldados de bom humor para que pudessem voltar para casa com o presente da mãe?
Raízes
Nabulsi nasceu em Londres, filha de pais palestinos. Seu pai, um palestino nascido no Egito, migrou para o Reino Unido para fazer um doutorado em engenharia civil. Sua mãe chegou via Kuwait quando sua família deixou a Palestina após a guerra de 1967. “Herdei minha rebeldia dela”, diz a cineasta.
Fragmentos de uma antiga memória
Farah Nabulsi tinha uma rotina de viagens à Palestina nas férias de família. A tradição teve fim após a Primeira Intifada, em 1987.
Em 2014, retornou à sua terra natal e ficou impressionada com o número de postos de controles e a extensão do chamado Muro da Vergonha que separavam palestinas e palestinos de suas famílias, terras e dos locais de trabalho.
Desta maneira, a última viagem de Nabulsi a estimulou a escrever o roteiro de “O Presente”, sob forte impacto com a realidade de uma Palestina repartida e militarizada.
Retratos humanos
Em entrevista ao The Guardian, a diretora revelou que já sabia exatamente como seriam os personagens. “Eu pude ver tudo na minha mente, o ator que faria o protagonista, o que a garotinha estava vestindo.”
Sobre o ambiente em que se passa boa parte do filme, e os momentos mais tensos também, Nabulsi compartilhou de sua própria experiência: “É humilhante e desumanizador ficar parado ali. Isso não é certo para nenhum ser humano. Os animais não devem ser tratados assim. Os postos de controle foram feitos para que sintamos ao máximo o desconforto.”
Se nos checkpoints o clima é hostil, nas demais cenas a diretora consegue apresentar o lado amigável, solidário e carinhoso dos personagens palestinos.
Para ela, além da denúncia das violações de direitos humanos básicos, como o de circular livremente pelas ruas, vilarejos e cidades, era muito importante poder retratar, sem os estereótipos habituais de Hollywood, os personagens da história.
Por isso, Nabulsi não se limitou a retratar o palestino como o homem de pele escura e barba cheia, ou como terrorista, “mas como um cara adorável, assim como são muitos árabes-palestinos barbudos”, disse.
Em suas redes sociais, a diretora e cineasta palestina afirma que “qualquer um que tenha visto este filme compreenderá porque eu dedico este prêmio ao povo da Palestina”.
O filme está disponível na Netflix, e a grande cerimônia do Oscar acontecerá em 25 de Abril.
Com informações do The Guardian